quarta-feira, 25 de maio de 2016

Dia nacional do cigano: uma luta de todas e todos

Hoje transcrevo artigo do Professor de direito, advogado e militante da Consulta Popular Phillipe Cupertino.


A partir de 24 de maio de 2007 é comemorado oficialmente o dia nacional do cigano, uma data que para a maioria da população pode passar despercebida, mas que foi celebrada por esses povos que habitam o Brasil desde o final do século XVI. Digo povos por se tratarem de sete etnias presentes em todo mundo, sendo que os mais comuns no Brasil são os roms, sintos e calons, aproximadamente um milhão de pessoas. 
Para o senso comum, a existência dos povos ciganos, quando é percebida de forma menos negativa, está associada ao exótico, em face das roupas coloridas, leituras de mãos, jogar cartas ou por conta das danças. Contudo, por séculos, a existência de tais povos esteve assim como ainda está associada à condutas deploráveis, são vistas como pessoas que “não se deve confiar” ou que “se deve esconder as mãos para não terem os anéis roubados”. Confesso que sinto muita vergonha de ter pensado dessa forma um dia. Hoje sei que o nomadismo não é algo inerente ao povo cigano e sim imposto pela falta de compreensão que o padrão eurocêntrico ocidental de sociabilidade os impôs, tornando-se, portanto, uma necessidade para poder sobreviver.
Como aprendi com Maria Jane, liderança cigana da Paraíba, pessoas ruins existem em todos os lugares, mas infelizmente falar em cigano já há presunção quase que absoluta de se tratarem de pessoas perigosas. Pois não são! Agradeço muito ao fato de hoje coordenar um projeto de extensão nas FIPs que faz Assessoria Jurídica Popular à Associação calon de Condado-PB. Como diria Paulo Freire, “não há saberes mais ou menos há saberes diferentes”. Hoje tenho a chance de me reconstruir enquanto ser humano, enquanto militante e profissional e ainda poder contribuir para essa desconstrução na sociedade e ao mesmo tempo dar visibilidade à causa e resistência cigana.
Dia 20 de maio de 2016 foi um dia histórico para a luta e resistência cigana! Em tempos em que as mulheres foram excluídas do primeiro escalão do governo Temer tivemos uma mulher e líder do movimento cigano, Maria Jane, palestrando para uma plateia do curso de direito da cidade de Patos, interior da Paraíba, ao lado de outra mulher guerreira, Jamilly Cunha, doutoranda em antropologia pela UFPE.
Conviver e respeitar os povos tradicionais, sobretudo os povos ciganos, é algo inerente à revolução brasileira, à luta pela soberania e emancipação dos povos historicamente oprimidos. O fim dos ministérios da cultura, direitos humanos e promoção e igualdade racial foi um golpe brutal na luta dos ciganos e ciganas que nos últimos anos, ainda que com recursos restritos, conseguiram finalmente acesso às políticas públicas e conquistarem visibilidade.
Derrotar o golpe dado pelos setores conservadores e fascistas da direita brasileira é dar de volta aos povos tradicionais o direito de poderem lutar por uma existência digna, de serem respeitados dentro das suas diferenças e usufruírem das riquezas produzidas pela classe trabalhadora.


sexta-feira, 20 de maio de 2016

O país da zoada

Os brasileiros que não cerram fileiras em partido A ou B querem que o Brasil dê certo, embora não creiam em milagres feitos por homens. Principalmente por homens investigados pela Lava-Jato. É uma mistura de esperança e ceticismo.
A bipolarização do país gerada pela crise política e econômica não dá sinais de que vai acabar. Na noite deste último domingo, enquanto o presidente em exercício, Michel Temer, concedia entrevista à Rede Globo, eu ouvia em meu bairro – Intermares – gritos de “Fora Temer” e panelaços, promovidos pelos simpatizantes do PT, e também fogos, provavelmente comemorativos, patrocinados pelos simpatizantes do novo governo e que foram às ruas pedir o impeachment da presidente Dilma. Fogos ali, gritos acolá, tudo junto e misturado.
Difícil acreditar em trégua política. Temer terá que administrar o país em meio a um clima tenso e buscar resultados positivos na economia, conquistar a credibilidade dos brasileiros, em primeiro lugar (difícil quando se tem ministros investigados por corrupção), e a dos investidores externos; dedicar-se a mudanças que se traduzam em números positivos (e não apenas a ações de maquiagem) e preparar-se e também aos brasileiros para medidas impopulares, se forem necessárias para manter o motor da governabilidade.
Petistas e seus simpatizantes estão raivosos e com perfil vingativo. Qualquer erro de Temer terá reação ruidosa. Haverá, talvez, tanta zoada quanto a que houve pelo impeachment da Dilma. E sem um rebate à altura. Afinal, aqueles brasileiros sem filiação partidária que foram às ruas no “Fora Dilma” já conseguiram o que queriam. Não esperem que eles voltem para comprar briga pelo novo governante, que terá muito mais trabalho, agora, para mobilizar multidões dispostas ao enfrentamento com as esquerdas. Afinal, o PMDB não tem know-how em mobilização popular como o PT, PC do B e outros partidos afins. O povo, agora, quer mudanças de fato, mais empregos, menos inflação. Serão, doravante, vigilantes do governo que, agora, virou vidraça.
Qualquer governo dá munição à oposição – uns mais, outros menos. No atoleiro em que o PT meteu o país, qualquer medida com vistas à recuperação econômica pode ser dolorosa e impopular, podendo levar o povo às ruas novamente. O novo ministro da Fazenda, Henrique Meireles, em seu primeiro pronunciamento, defendeu a volta da CPMF. Caso aprovada, não precisa de muito mais espinhos para causar rebuliço na população impaciente.
A manifestação ruidosa no meu bairro, num domingo à noite, dá mostras de que o clima no país continuará tenso e que o atual governo terá uma oposição disposta a também levar multidões às ruas ante qualquer escorregão de Temer e sua equipe. Uma oposição inconformada e que range os dentes. Disposta a tudo.
Melhor seria se o povo soubesse votar. Enquanto isso, tome zoada.



quinta-feira, 12 de maio de 2016

Um mau começo

Oi? Ouvi direito? Nenhuma mulher. Nenhum negro. E pelo menos sete investigados pela Operação Lava-Jato. Esse é o ministério do governo Michel Temer. Começou mal.
Se a exclusão foi deliberada, sinal de que é preconceituoso e racista. Se “apenas” esqueceu, também o é. O que ele jamais poderá alegar é que, entre seus partidários e outros aliados não exista sequer um nome de mulher ou pessoa negra capaz de figurar no primeiro escalão. Portanto, indesculpável sua omissão.
Temer fez um discurso agradável na tarde desta quinta-feira. Disse o que o povo queria ouvir. Afinal, há uma demanda por governo – neste segundo mandato, Dilma não conseguiu governar de fato – e ele soube aproveitar a oportunidade para garantir que, agora sim, o Brasil passará a ter uma rotina de ações governamentais para a retomada do crescimento econômico. Tudo dentro da ordem e visando o progresso.
Mas discursos são feitos e logo esquecidos. Ele também fez discursos enaltecendo a presidente Dilma durante a campanha, teceu loas ao PT e jurou fidelidade. Houve até “bolo de casamento” com direito a bonequinhos dele e da presidente petista no topo. Assim é a política que se pratica no Brasil e no presidencialismo de coalizão.
A boa retórica do discurso na posse dos novos ministros não encobre o ato falho do presidente em exercício. E não adianta compensar a omissão com cargos nos segundo e terceiros escalões. Ok, eles são bem-vindos, mas não são suficientes e a mancha vai permanecer.
Num momento em que mulheres e negros lutam por ações positivas para conquistar mais espaço na sociedade, tentando isonomia de oportunidades e menos preconceito, o presidente em exercício de um país combalido, insolvente e carente por justiça dá uma pisada na bola em seu pontapé inicial de gestão. Tropeçou de cara. E está longe de marcar um gol.
Será mesmo que ele acredita que o modelo ideal de mulher seja mesmo uma bela loira, jovem, recatada e do lar?






terça-feira, 3 de maio de 2016

Tão bonzinhos!

Os tucanos não surpreendem. Tentam se fazer de bonzinhos. Muitos apostavam que o PSDB iria ficar em cima do muro assistindo à inviabilização do provável futuro governo Temer, mas  eis que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende que o partido assuma os riscos do impeachment que ajudou a construir. Diz que, neste momento, é preciso solidariedade. Aécio Neves emenda afirmando que o partido prefere o risco à omissão.
A curto prazo, o PSDB pode estar de olho nos espaços nobres no novo governo. A longo prazo, a conta dessa investida é uma incógnita. Nada aponta para uma reviravolta na economia e muito menos na imagem externa do Brasil, apesar do futuro presidente sinalizar que concentrará esforços na retomada da credibilidade do país junto aos investidores estrangeiros. Mas, a depender dos esforços, o cenário pode se tornar menos tumultuado. Vale o otimismo.
O PMDB e seus aliados terão pela frente a árdua tarefa de devolver ao país uma imagem satisfatória para brasileiros e capital externo. A retomada do crescimento, após sucessivas e preocupantes quedas do PIB, alta de preços, desemprego assustador e impostos nas alturas, não será nada indolor. Os anos de mascaramento de números, o que se configura estelionato eleitoral, vão exigir novos sacrifícios.
Os gastos públicos terão que ser contidos. O governo brasileiro gasta muito e de forma errada. Gastos públicos são necessários para a economia e bem-estar social, quando bem aplicados. Mas um estudo do banco Credit Suisse que analisa o patamar das despesas do governo de diferentes países aponta que nossos gastos são altos e ineficientes. Ou seja, além de não ajudar em nada, ainda agrava a crise. O Brasil, segundo esse estudo, é o 28º entre 39 países em eficiência dos gastos públicos. E o mais grave: a pior situação está justamente nos gastos com saúde e educação.
É neste cenário que PMDB e PSDB unirão esforços para o que os tucanos chamam de “governo de emergência”. Se os resultados forem positivos, embora ninguém espere mágica, ponto para os dois partidos.
Vale dizer também que o risco do PSDB é bem calculado. Se realmente Temer levar à frente a ideia de acabar com a reeleição, os tucanos estarão na linha de frente da sucessão.
Por ora, serão coadjuvantes de luxo. No futuro, prováveis protagonistas.